Casa comum: COP-30 no caminho do legado do papa Francisco para a Amazônia

Uma série de decisões e manifestações ocorreu para tornar evidentes as demandas do líder católico para a região, desde o Sínodo da Amazônia até o reconhecimento de santos, e que encontrará a Conferência do Clima, a ser realizada em Belém, em novembro de 2025, no caminho episcopal.
Papa Francisco e indígenas/CNBB

Há pelo menos cinco anos, o papa Francisco desencadeou um processo de reconhecimento da Amazônia como fundamental para a Igreja e sua presença no mundo, admitindo, por meio de documentos oficiais, que o desenvolvimento da região deveria ser adotado como estratégia para cada católico do mundo. Desde então, uma série de decisões e manifestações ocorreram para tornar evidentes as demandas do líder católico, desde o Sínodo da Amazônia até o reconhecimento de santos, e que encontrará a Conferência do Clima, a ser realizada em Belém, em novembro de 2025, no caminho episcopal.

O ato mais recente do Papa Francisco, um padre jesuíta argentino nascido como Jorge Mario Bergoglio, foi receber no Vaticano, no último dia 22 de outubro, a imagem de Nossa Senhora da Amazônia, entregue pelo cardeal e arcebispo de Manaus, Dom Leonardo Steiner, e o padre Adelson Santos. O presente foi enviado pela comunidade Nossa Senhora da Amazônia em Manaus, capital do Amazonas, para pedir a benção ao pontífice.

A entrega da imagem ocorreu quase que simultaneamente ao reconhecimento de um milagre na Amazônia brasileira pelo italiano José Allamano, fundador dos Missionários da Consolata. Nascido em 1851 na região do Piemonte, Itália, e falecido em 1926, o santo jamais deixou seu país natal, mas tornou-se fervoroso incentivador das missões religiosas católicas internacionais, principalmente, no Quênia e no Brasil, sendo beatificado em 1990 pelo papa João Paulo II por sua dedicação à igreja e suas ações no mundo.

Foto: Divulgação.

O reconhecimento de santidade de Allamano ocorre devido a um agora admitido milagre registrado na Terra Indígena Yanomami, em Roraima, amazônia brasileira. A decisão foi anunciada no último dia 23 de outubro de 2024, quando o Papa Francisco recebeu o cardeal Marcello Semeraro, prefeito de Dicastério para a Causa dos Santos, para autorizar a canonização do Allamano.

Em 1996, após ser atacado por uma onça, o indígena Sorino Yanomami teve a cabeça dilacerada e parte dela devorada pelo animal, mas sobreviveu após receber cuidados por missionárias Consolata, que pediram sua recuperação em orações ao padre José Allamano. Ainda vida, a missionária Maria da Silva, responsável pelos cuidados e orações após o ataque da onça, disse que Sorino chegou a ser dado como morto, quando as missionárias começaram a pedir por um milagre a Allamano.

A vítima do ataque foi transferida do território indígena para um hospital em Boa Vista, Roraima, após oito horas, tendo se recuperado completamente dez dias depois. Nesse período, um grupo de missionários realizou novenas invocando a José Allamano, com uma relíquia do italiano junto à cama de Sorino. O pedido de reconhecimento do santo teve início pelas Consolatas de Roraima junto ao Tribunal Diocesano para a Causa dos Santos em 2020 e foi finalmente atendido em 2024.

Jornada sinodal

A trajetória dos encontros do Papa Francisco com a Amazônia se revelou para o mundo com o anúncio em Puerto Maldonado, no Peru, em 2017, do Sínodo da Amazônia, um processo de escuta junto às comunidades católicas, apresentado em 2019 com o tema “Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”.

Dois anos depois do término do Sínodo, o papa divulgou a Exortação apostólica pós-sinodal, Querida Amazônia, manifesto voluntário no qual o Pontífice anuncia seus “sonhos para a Amazônia”. Francisco exalta, no documento, quatro grandes sonhos para a Amazônia, para “que lute pelos direitos dos mais pobres”, “que preserve a riqueza cultural”, “que guarde zelosamente a sedutora beleza natural”, que, por fim, as comunidades cristãs sejam “capazes de se devotar e encarnar na Amazônia”.

Passados mais de cinco anos desde o Sínodo, os Atos da Assembleia Especial dos Bispos dedicados à Amazônia foram reunidos e apresentados em julho desse ano, no Vaticano, no documento “Novos caminhos para a Igreja e por uma ecologia integral”.

Durante todo esse período, religiosos, leigos e representantes das populações tradicionais reuniram as reflexões sobre novos caminhos para a Igreja na Amazônia e para a ecologia integral num documento entregue ao Papa. Entre junho de 2018 e abril de 2019, foram realizadas as chamadas escutas pré-sinodais sob a coordenação da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM), nos países da Pan-Amazônia (Brasil, Peru, Colômbia, Bolívia, Venezuela, Guiana, Guiana Francesa e Suriname), ouvindo 87 mil pessoas na região, com destaque para indígenas, ribeirinhos, quilombolas, mulheres, jovens, religiosos e religiosas.

Após, bispos de todos os nove estados, dos quais 58 oriundos da região amazônica, foram chamados para a reunião. O documento final tem cinco capítulos, reconhece a Amazônia como coração biológico e como terra cada vez mais ameaçada, de fundamental importância a produção e distribuição das chuvas nas regiões da América do Sul e para os movimentos de ar ao redor do planeta. Além disso, aponta os riscos de desmatamento e devastação da floresta Amazônica.

A conversão integral (pastoral, cultural, ecológica e sinodal), então, visaria à criação de estruturas em harmonia com o cuidado da criação; reconhecendo a interação de tudo que foi criado. Entre os principais itens, papa Francisco chama cristãos do mundo a defender a Amazônia, com um “rosto amazônico”, e que a Igreja tenha este rosto, levando aos povos o “direito ao anúncio do Evangelho”; do contrário, “cada estrutura eclesial transformar-se-á em mais uma ONG”.

Foto: VaticanNews

Não por acaso, em outra referência à região, em novembro de 2023, o papa Francisco utilizou vestes litúrgicas idealizadas pelo artista brasileiro Juan Gabriel Albuquerque Ramos, natural de Manaus, com homenagens à Amazônia para celebrar a missa de encerramento do Sínodo dos Bispos, em tons de verde, que simbolizavam as diversas espécies de árvores da floresta Amazônica.

Agora, a expectativa é que, em nome de uma igreja com rosto amazônico, o papa Francisco aceite o convite do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), para participar da COP-30, que reunirá líderes globais pelo meio ambiente. Com isso, mostrar quais caminhos serão percorridos pela Igreja até ali para a formação do “rosto amazônico” e quais serão os passos dali pra frente.

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